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Carol Almeida Terapias

Racismo, afeto e silêncio: como os vínculos familiares carregam as marcas do mito da democracia racial

Mito da Democracia Racial. Na segunda metade do século XIX, enquanto o Brasil buscava se redefinir após a abolição da escravidão, a Teoria Eugenista passou a orientar políticas e imaginários. A ideia de que haveria uma “raça superior” — branca, europeia, mais civilizada — sustentou a formulação da teoria do branqueamento, segundo a qual o progresso do país dependeria do enfraquecimento da presença negra na população. Incentivou-se, então, a imigração europeia, com a expectativa de que, em algumas gerações, o Brasil se tornaria um país majoritariamente branco — e, portanto, mais “desenvolvido”.

A pintura A Redenção de Cam, de Modesto Brocos, tornou-se símbolo desse ideal. A cena representada — uma avó negra, uma mãe mestiça, um neto branco — ilustra a ideologia de embranquecimento como projeto de nação.

Primeiras décadas do século XX

Nas primeiras décadas do século XX, esse imaginário deu origem a um discurso que se consolidou com força: o de que o Brasil seria uma democracia racial. Na obra Casa-Grande & Senzala, Gilberto Freyre descreveu as relações entre senhores e escravizados como harmônicas, defendendo que a miscigenação havia criado um povo cordial, unido, sem antagonismos raciais profundos. No entanto, o que esse discurso ignorava — ou deliberadamente omitia — era a violência sistemática, o apagamento cultural, o abuso sexual, a exploração econômica e a resistência que marcaram nossa formação social.

Na segunda metade do século XX, autores como Florestan Fernandes questionaram essa narrativa, demonstrando que se tratava de um mito: uma imagem idealizada que, ao ser repetida, impedia o reconhecimento das desigualdades reais, da exclusão histórica e da marginalização de povos negros e indígenas.

Mas o impacto desse mito não se limita ao campo das ideias. Ele continua presente nas estruturas sociais e, principalmente, nas formas de afeto que se constroem dentro das famílias brasileiras.

Nesse sentido, na Psicogenealogia, compreendemos que traumas históricos não se encerram no passado: eles se internalizam, se repetem, se expressam em sintomas, silêncios e vínculos. O que não foi elaborado se torna padrão. O que não foi dito, se transforma em crença.

Lélia Gonzalez – neurose cultural brasileira

A filósofa e psicanalista Lélia Gonzalez nomeia os efeitos psíquicos dessa idealização racial como neurose cultural brasileira — uma estrutura coletiva que naturaliza o racismo, silencia a violência, e transforma desigualdade em normalidade. Logo, essa neurose atravessa gerações, influenciando profundamente a constituição da identidade e dos laços familiares.

É nesse ponto que proponho, no trabalho com a Psicogenealogia, reconhecer a escravidão como um trauma transgeracional e investigar os efeitos do mito da democracia racial dentro das dinâmicas familiares. Esse olhar está desenvolvido em profundidade no meu artigo Família de todas as cores: desvendando os impactos do mito da democracia racial nas dinâmicas familiares no Brasil, publicado no livro Psicogenealogia: temas e reflexões (2025).

Psicogenealogia os conceitos de neurose cultural brasileira,

Nesse artigo ,proponho  incorporar  na Psicogenealogia os conceitos de neurose cultural brasileira, desenvolvido por Lélia Gonzalez e o pacto narcísico da branquitude, desenvolvido por Maria Aparecida Bento — que nos ajudam a compreender como os privilégios se perpetuam e como o pertencimento é regulado por lógicas de exclusão racial.

Essas lógicas aparecem disfarçadas de cuidado, de conselho, de elogio. Frases como:

– “Ela tem traços finos.”
 – “É negra, mas é bonita.”
 – “Cabelo liso é mais apresentável.”

…revelam crenças internalizadas que associam valor, beleza e dignidade a uma estética branca. São pactos inconscientes que estabelecem quais corpos merecem afeto pleno e quais devem se moldar para caber. Transmitidas como verdades naturais, essas ideias se instalam no cotidiano, estruturando as expectativas, os afetos e até as possibilidades de pertencimento.

Como escreveu Bell Hooks:
 “Embora quisesse conhecer o amor, tinha medo de ter intimidade de fato”.
Essa frase nos recorda que herdamos o modo como aprendemos a amar. Em muitas famílias negras e miscigenadas, aprendemos o afeto em contextos de escassez emocional, sobrecarga e dureza — especialmente quando a sociedade negava ou condicionava o reconhecimento da identidade.

Reconhecer esses legados não significa reviver a dor como destino, mas compreendê-la como passagem. Como escreveu Lélia Gonzalez:
 “A gente não nasce negro, a gente se torna negro. É uma conquista dura, cruel e que se desenvolve pela vida da gente afora.”

Mito da Democracia Racial e Psicogenealogia,

Sob essa perspectiva na Psicogenealogia, colocamos a questão racial no centro da escuta para dar lugar à memória negada. Acolhemos os afetos distorcidos, os silêncios herdados e as crenças transmitidas sem consciência de sua origem. Permitimos que a identidade se reconecte com a verdade e que os vínculos se reorganizem — não mais sustentados por pactos de apagamento, mas por escolhas conscientes, enraizadas na dignidade e na liberdade de ser. É nesse gesto — delicado, persistente, amoroso — que começa o trabalho de transformação.

Nós trabalhamos cuidadosamente esses e muitos outros temas em nosso atendimento terapêutico. Clique aqui e descubra como podemos acompanhar você nessa jornada.

O III Simpósio Internacional de Psicogenealogia: quando a história familiar encontra o compromisso com a transformação

Entre os dias 28 e 30 de março, em Florianópolis, aconteceu o III Simpósio Internacional de Psicogenealogia, um dos principais encontros dedicados ao campo das heranças transgeracionais. Reunindo profissionais do Brasil e da França, o evento foi um espaço vivo de escuta, partilha e aprofundamento.

O tema deste ano —
 “Memórias familiares: amores e traumas – Vamos falar de amor?” — propôs um olhar sensível e comprometido sobre o afeto como lugar de transmissão, silenciamento e, também, de transformação.

Ao longo dos três dias, o público teve a oportunidade de dialogar com nomes fundamentais da Psicogenealogia, como Noëlle Lamy, Bruno Clavier, Marie Noëlle, Jean-Philippe Brébion, Vicent de Gaulejac, Pierre Ramaut, Danielle Flaumenbaum, Mônica Justino, entre outros. Uma oportunidade potente de troca e aprendizado.

Tive a alegria de integrar a mesa redonda “A complexidade das relações afetivas”, com a apresentação “O mito da democracia racial e suas marcas nas relações afetivas”.

Minha proposta foi refletir sobre como o mito da democracia racial — narrativa criada no Brasil para sustentar a ideia de uma convivência harmoniosa entre diferentes grupos raciais — se infiltra silenciosamente nos vínculos familiares. Ao negar o racismo como estrutura social, esse mito transforma a exclusão em norma, especialmente para pessoas negras de fenótipo mais marcado. E, quando essa dimensão não é nomeada nas histórias familiares, o afeto se torna assimétrico, condicionado à negação da identidade.

Com base na Psicogenealogia e no conceito de neurose cultural brasileira, elaborado por Lélia Gonzalez, compartilhei um estudo de caso clínico que evidencia como essas marcas se expressam no corpo e nas relações. Falei também sobre a importância de integrar a questão racial no trabalho com o genossociograma, como forma de ampliar o reconhecimento, reorganizar o pertencimento e criar vínculos mais verdadeiros.

Participar desse Simpósio foi, para mim, um gesto de responsabilidade com o campo da Psicogenealogia. Trazer a questão racial para o centro da escuta é também contribuir para que essa escuta seja mais ampla, consciente e reparadora.

Gratidão à organização do evento, às colegas de mesa e a todas as pessoas que compuseram esse encontro.

Clique aqui e veja mais fotos do congresso.

Reconecte-se com sua essência através da sua história

Psicogenealogia, Constelação Familiar e terapias integrativas para transformar padrões herdados e viver com mais consciência.

Você já percebeu que certas situações se repetem, mesmo depois de várias tentativas de mudança?
 Relacionamentos que não fluem, dificuldades em se posicionar, padrões emocionais que parecem não ter origem clara.

Esses ciclos quase sempre têm uma história — e essa história pode não ter começado com você.
 Muitas das nossas dores, bloqueios e comportamentos vêm de experiências vividas no campo familiar, no nascimento, na infância ou até de traumas herdados inconscientemente ao longo de gerações.

Nos atendimentos que conduzo, olhamos para isso com responsabilidade e sensibilidade. A proposta não é apagar o passado, mas compreendê-lo — para que você possa fazer escolhas mais conscientes no presente e criar novas possibilidades de vida.

Como funcionam os atendimentos

As sessões têm duração média de 40 minutos a 1 hora. No primeiro encontro, recomendo reservar um tempo maior para que possamos mapear sua história com calma e clareza. A frequência pode ser quinzenal ou definida conforme a necessidade do processo.

Abordagens que posso integrar durante o acompanhamento:

  • Psicogenealogia

  • Exercícios sistêmicos de Constelação Familiar

  • ThetaHealing

  • Reiki

  • Terapia Floral

  • QuantumBeing

Cada atendimento é personalizado: avalio junto com você qual técnica ou abordagem é mais adequada para o momento que está vivendo.

A sessão de Constelação Familiar tem um formato específico, com duração maior, e é indicada quando há uma questão que precisa ser olhada com mais profundidade no sistema familiar ou ancestral.

Modalidades de atendimento

  • Online, para todo o Brasil e exterior

  • Presencial, em Belo Horizonte

Este é um espaço de escuta, cuidado e transformação — voltado para quem deseja ir além dos sintomas, reconectar-se com sua essência e viver com mais consciência da própria história.

Agende sua Consulta.

Psicogenealogia: o que é e como influencia sua vida

Nem tudo que sentimos, escolhemos ou evitamos começou em nós.
 Muitas vezes, o que vivemos é a continuação inconsciente de algo que ficou mal resolvido em uma geração anterior.

A psicogenealogia é uma abordagem terapêutica que investiga o sistema familiar, com o objetivo de compreender como traumas, vínculos e dinâmicas vividas por nossos antepassados seguem atuando silenciosamente sobre nossas vidas.

O que é Psicogenealogia?

A psicogenealogia parte do princípio de que somos atravessados (qual palavra pode substituir essa)  por uma herança emocional e psíquica transmitida de geração em geração.
 Essa transmissão ocorre de forma simbólica, afetiva ou até somatica (o que aqui pode ficar mais claro)— mesmo quando não temos conhecimento da origem.

Traumas, segredos, exclusões, perdas e histórias que não puderam ser elaboradas se perpetuam como padrões repetitivos, sintomas emocionais ou físicos, relacionamentos disfuncionais ou limitações existenciais que insistem em se manifestar.

O trabalho da psicogenealogia não é voltado à análise linear dos fatos, mas à investigação da lógica invisível que organiza a vida psíquica dentro de uma árvore familiar.

Três movimentos inconscientes estruturam essa transmissão:

 Projeção

Desde a concepção, o indivíduo já é projetado: como desejo, como solução, como substituto. Antes mesmo de nascer, ele já ocupa um lugar simbólico. Essa expectativa marca o início de uma trajetória que muitas vezes carrega um peso que não lhe pertence.

 Identificação

Durante a infância, somos nomeados, rotulados e comparados. Tornamo-nos, simbolicamente, “iguais a alguém” — e com isso, herdamos mais que traços: herdamos destinos, conflitos, dívidas emocionais. A identificação é um elo poderoso, mas também limitador.

 Repetição

O que não foi elaborado tende a se repetir. Repetimos histórias nos afetos, nas escolhas profissionais, nas rupturas. Como se o sistema familiar, por meio de nós, tentasse completar algo que ficou suspenso. Essas repetições não são conscientes — mas revelam a profundidade da lealdade invisível que temos à nossa origem.

A lógica emocional da árvore genealógica

A psicogenealogia nos convida a olhar para a árvore genealógica não como um registro biográfico, mas como um sistema de vínculos.

Por meio do genossociograma — uma representação gráfica expandida da árvore genealógica—, investigamos não apenas os nomes e datas, mas os padrões emocionais que se repetem ou se ocultam. O que se busca é compreender quais vínculos foram negados, quais histórias foram silenciadas e como isso ainda ressoa nos descendentes.

Exclusões, lutos não elaborados, abortos, falências, eventos trágicos, relações rompidas ou idealizadas, mortes traumáticas — tudo isso pode, sem que se perceba, moldar comportamentos, reações, decisões.

Para que serve a Psicogenealogia?

O trabalho com psicogenealogia permite:

  • Interromper padrões repetitivos que se perpetuam por lealdade inconsciente;

  • Compreender sintomas emocionais ou físicos que resistem à lógica biográfica;

  • Reconhecer vínculos simbólicos ocultos que limitam escolhas ou perpetuam sabotagens;

Não se trata de buscar culpados, nem de “culpar os antepassados”.
 Trata-se de nomear o que foi negado, incluir o que foi excluído e liberar o que não precisa mais ser carregado.

A Psicogenealogia como caminho terapêutico

O processo pode ser realizado dentro de uma jornada terapêutica ou como investigação pontual. A construção do genossociograma, aliada à escuta clínica, permite identificar padrões, entender os sentidos simbólicos das repetições e reconhecer quais heranças emocionais podem, enfim, ser devolvidas ao sistema.

A herança que podemos transformar

A psicogenealogia nos mostra que há histórias que não vivemos, mas que seguimos contando.
 Há dores que não são nossas, mas que seguimos sentindo.
 E há padrões que, uma vez reconhecidos, podem ser finalmente interrompidos.

Conhecer sua história não é se prender ao passado — é se liberar do que não precisa mais ser repetido.
 É, acima de tudo, assumir o direito de viver algo novo.

Constelação Familiar: Técnica Sistêmica para Entender Vínculos, Padrões Repetitivos e Heranças Familiares

Você já percebeu que, por mais que se esforce, algumas situações se repetem em sua vida? Relacionamentos que seguem o mesmo roteiro, decisões que não avançam, sentimentos que parecem não ter explicação?

A Constelação Familiar é uma abordagem terapêutica que permite investigar padrões que atravessam gerações e que, mesmo de forma inconsciente, influenciam comportamentos, escolhas e vínculos.
 A técnica parte de uma compreensão sistêmica: nem tudo que vivemos começou em nós.

Um olhar transgeracional sobre a vida

A Constelação Familiar entende o indivíduo como parte de um sistema maior — sua família. Dentro desse sistema, atuam dinâmicas ocultas que não vemos, mas sentimos: lealdades silenciosas, exclusões, inversões de papéis, dores que se repetem como ecos entre gerações.

Essas forças moldam relações, decisões e até sintomas físicos e emocionais. Elas não estão nas palavras, mas nos padrões — e, por isso, muitas vezes não conseguimos acessá-las apenas pela via racional.

Foi  Bert Hellinger quem sistematizou esse conhecimento em uma prática terapêutica. Após décadas de observação — especialmente durante seu trabalho com o povo Zulu, na África do Sul —, Hellinger percebeu como o pertencimento, o respeito à hierarquia e os vínculos familiares afetavam diretamente a saúde emocional e relacional das pessoas.

Ele integrou elementos de terapias como psicodrama, Gestalt-terapia e análise transacional, criando uma abordagem que não busca culpados, mas sim reconhecer o lugar de cada um dentro da própria história.

Os três princípios da Constelação Familiar

A técnica é fundamentada em três princípios sistêmicos, observados em todos os sistemas humanos — especialmente os familiares:

  • Pertencimento: todos têm o direito de fazer parte. Quando alguém é excluído, ignorado ou esquecido, o sistema responde — muitas vezes por meio de um descendente que, inconscientemente, tenta compensar essa ausência.

  • Ordem: existe uma hierarquia natural — os que vieram antes ocupam um lugar anterior aos que vieram depois. Quando filhos assumem papéis de pais, por exemplo, o sistema entra em desordem.

  • Equilíbrio entre dar e receber: relações saudáveis se baseiam em trocas justas. Quando há desequilíbrio, surgem conflitos, afastamentos ou ressentimentos.

Ao revelar essas dinâmicas ocultas, a Constelação permite que o cliente compreenda a origem de muitos de seus bloqueios — e, a partir daí, possa fazer escolhas mais conscientes.

Onde a técnica se aplica?

A Constelação Familiar pode ser aplicada a diversas áreas da vida, sempre que há um sintoma persistente, uma repetição de padrões ou um desconforto que não se explica apenas pelo presente.

  • Relacionamentos afetivos: repetições de padrões, vínculos instáveis, dificuldades em se vincular ou se separar.

  • Questões financeiras: dificuldade em prosperar, perdas recorrentes, sensação de não merecimento.

  • Conflitos familiares: distanciamento, rivalidades, dores herdadas que se manifestam em gerações posteriores.

  • Trajetória profissional: bloqueios, sensação de estagnação, não reconhecimento, dificuldade de se desenvolver na profissão.

  • Cargas emocionais intensas: tristeza persistente, raiva desproporcional, medo sem causa aparente.

Muitas dessas situações são expressões de algo que o sistema familiar tenta, inconscientemente, reorganizar. A Constelação oferece um caminho para essa reorganização interna.

Como funciona uma sessão de Constelação?

A Constelação pode ser realizada em grupo ou de forma individual. No atendimento individual — presencial ou online — utilizo recursos como cristais, âncoras espaciais ou visualizações guiadas, que representam os elementos do sistema familiar de forma sensível e estruturada.

O cliente não precisa contar toda a sua história. O campo sistêmico revela o que está pronto para ser visto — e a intervenção é feita com precisão, técnica e respeito.

Realizo atendimentos individuais em Belo Horizonte e também online, com a mesma seriedade, escuta qualificada e foco na transformação real. Cada sessão é conduzida com ética, cuidado e profundo respeito pela história de cada pessoa.

Um convite à consciência e ao movimento

A Constelação Familiar não é uma solução mágica, nem uma resposta definitiva. Em muitos casos, o que surge na sessão abre caminhos que precisam ser elaborados em processo terapêutico contínuo.

Mas é, sim, um ponto de virada: um convite para enxergar com mais clareza, reconhecer o que foi excluído e devolver o que já não precisa ser carregado.

Se você sente que está pronto para olhar para sua história com mais profundidade, agende sua constelação. A transformação começa no momento em que você decide ver — e se permitir um novo lugar dentro do seu próprio sistema.

Tomar os Pais: O Que Isso Realmente Significa na Filosofia Sistêmica?​

Na Filosofia Sistêmica, que fundamenta a Constelação Familiar, um dos conceitos centrais é a necessidade de “tomar os pais” para alcançar plenitude e sucesso na vida. Mas o que isso realmente significa na prática?

Quando ouvi essa ideia pela primeira vez, estava em um momento difícil. Me diziam: “Pare de tentar mudar seus pais e olhe para sua própria vida”, mas aquilo não fazia sentido para mim. Afinal, como poderia simplesmente aceitar algo que me parecia tão complexo?

Com o tempo, compreendi que tomar os pais não é um ato único, mas um movimento diário—como beber água. É sobre autocuidado, respeito à própria história e um profundo “sim” para a vida.

O Que Significa Tomar os Pais na Prática?

Diferente do que muitos imaginam, tomar os pais não exige uma relação próxima ou idealizada com eles. Trata-se de uma postura interna que se reflete nas pequenas escolhas diárias:

  • Cuidar do próprio corpo e bem-estar;
  • Nutrir boas relações;
  • Engajar-se no trabalho e na vida com presença;
  • Concordar com o que foi até aqui e se abrir para outras possibilidades.

Cada vez que fazemos escolhas que nos respeitam, estamos honrando a vida que nos foi dada.

Um Exemplo Simples e Poderoso

Imagine alguém que, há anos, leva uma rotina desorganizada, dormindo tarde, pulando refeições e constantemente exausto. Ele sente que seu corpo está sempre no limite, mas ignora os sinais.

Um dia, escolhe começar a fazer diferente, ajustando pequenos hábitos: estabelece horários fixos para dormir, cria um ritual para desacelerar antes de deitar e passa a se alimentar melhor.

Após algumas semanas, percebe o impacto: mais disposição, mais clareza mental e um bem-estar profundo. Sem perceber, ele fez um movimento essencial: tomou os pais. Respeitou o corpo que recebeu, cuidou dele e assumiu a responsabilidade pela própria vida.

Esse movimento não precisa ser grandioso. Ele acontece nos gestos mais simples, na maneira como nos colocamos no mundo, na aceitação de quem somos e da vida que recebemos.

Na Constelação Familiar, tomar os pais não é sobre perdoar ou esquecer dores do passado, mas sobre reconhecer que a vida veio através deles—e, ao aceitarmos isso, nos fortalecemos.

E você, já percebeu como esse conceito aparece no seu dia a dia?

Ainda Estamos Aqui: Memória, Legado e a Conquista Transgeracional de Fernanda Torres

A história de uma pessoa nunca começa nela mesma. O passado deixa rastros, e, essas marcas são transmitidas de geração em geração. Algumas conquistas não acontecem de forma imediata — elas exigem tempo, amadurecimento e, muitas vezes, ultrapassam a vida de quem as sonhou primeiro. A vitória de Fernanda Torres no Globo de Ouro e no Oscar de Melhor Filme não é apenas um feito individual, mas um reflexo de como a memória e o legado familiar moldam trajetórias.

Ao dedicar seu prêmio à mãe, Fernanda Montenegro, Fernanda Torres reforça um princípio essencial: nenhuma conquista é isolada. Há 25 anos, sua mãe esteve naquele mesmo espaço, concorrendo por Central do Brasil. O tempo avançou, mas o caminho trilhado segue presente, provando que o reconhecimento pode vir tardiamente, mas nunca desconectado da história que o antecedeu. Às vezes, é preciso mais de uma geração para que um sonho se concretize — e essa continuidade torna a conquista ainda mais significativa.

Entre Mãe e Filha: Um Exemplo de Lealdade Positiva

A conexão entre Fernanda Montenegro e Fernanda Torres vai além do talento. Elas compartilham uma herança emocional e profissional, onde o passado de uma fortalece a jornada da outra. No cinema, no teatro e na televisão, mãe e filha não competem, mas ampliam o legado familiar, provando que o sucesso também se constrói a partir do reconhecimento de quem veio antes.

Esse é um exemplo de lealdade positiva, conceito que, na psicogenealogia, representa a transmissão saudável de valores e talentos entre gerações. Em vez de repetir padrões inconscientes ou carregar o peso da ancestralidade como um fardo, Fernanda Torres integra a história de sua mãe à sua própria trajetória de forma consciente e fortalecedora.

A Preservação da Memória: Marcelo Paiva e a Importância do Registro

Se no cinema a continuidade familiar é evidente, a história de Marcelo Paiva nos lembra que a memória também é um pilar essencial na construção da identidade. Seu livro, que inspirou o filme Ainda Estou Aqui, revisita a história de sua família e a ausência deixada pelo desaparecimento de seu pai durante a ditadura militar.

Mais do que um relato pessoal, essa narrativa reflete como as histórias familiares estão ligadas a acontecimentos maiores e que preservá-las é fundamental para a construção da identidade individual e coletiva. A família Paiva, assim como muitas outras, carrega em sua trajetória as marcas de um passado que não se encerra, mas que pode se ressignificar a cada nova geração. O filme dirigido por Walter Salles transforma esse percurso de dor,silenciamento e ausência em um registro que impede que o passado se apague e fortalece o entendimento de que, muitas vezes, as lutas de uma geração só encontram resposta na seguinte.

Conclusão: A História Familiar e Coletiva Como Alicerce

Na psicogenealogia, entendemos que nossa história individual está entrelaçada às vivências de nossos antepassados. O que herdamos vai além de traços físicos ou talentos: carregamos marcas emocionais, padrões familiares e até destinos interrompidos que, muitas vezes, buscamos ressignificar sem perceber. E, mais do que isso, nossas histórias familiares estão inseridas em um contexto coletivo maior, onde cada trajetória individual se cruza com movimentos históricos e sociais que também influenciam o desenrolar das conquistas.

A trajetória de Fernanda Torres é um exemplo de como uma conquista pode começar em uma geração e se concretizar na seguinte, sem que isso diminua o mérito de quem a alcançou, mas sim reafirma a força da continuidade. Assim como sua mãe pavimentou um caminho para que seu talento brilhasse, a família Paiva carrega em sua luta a resistência de uma história que se recusa a ser esquecida. As duas histórias mostram como o passado está vivo em nós, atravessando gerações e nos convidando a dar novos significados à dor. No caso da família Paiva, essa ressignificação não apaga a violência sofrida nem minimiza a injustiça, mas reafirma a importância da memória como ferramenta de transformação.

Memória e legado não são apenas lembranças do que passou, mas forças que impulsionam o futuro. Enquanto soubermos reconhecer nossas raízes, continuaremos avançando. Ainda estamos aqui, e seguiremos.

O Trauma Transgeracional: A Dor Que Não Começou em Você

Miro o corpo diante de mim – tenso, contraído, sustentando um peso que não sei nomear.

Os ombros erguidos parecem carregar algo maior que a rotina pesada. O olhar baixo evita encontros. A respiração curta não se aprofunda, como se buscar ar fosse perigoso. O corpo fala antes mesmo das palavras chegarem.

A voz sai hesitante: “Não sei por que me sinto assim.”

Mas a história vem antes da explicação. O que se sente hoje pode ter raízes muito mais antigas do que se imagina.

A Dor Que Passa de Geração em Geração

Há traumas que são vividos e lembrados. Outros são vividos e silenciados.

E há aqueles que nunca foram vividos por quem os sente – mas, ainda assim, estão ali, alojados na pele, no comportamento, na memória inconsciente do corpo.

Os pesadelos que se repetem sem lógica.
O medo da escassez, mesmo quando nada falta.
A sensação de abandono, mesmo cercado de afeto.

O trauma transgeracional não precisa de palavras para existir. Ele se infiltra nos gestos, na forma como alguém se encolhe ao falar, na ansiedade que chega sem motivo. Ele se espalha pelas famílias como um eco: o que não foi elaborado antes se manifesta depois.

A avó que sobreviveu a uma guerra, e o neto que sente medo constante, mesmo sem ter vivido uma tragédia.
A mãe que nunca chorou a perda que sofreu, e a filha que carrega uma tristeza sem nome.
A geração que passou fome, e os descendentes que acumulam, temendo perder tudo.

Não basta esquecer. O que não é visto continua procurando uma forma de existir.

Quando o Corpo se Torna o Mensageiro

O corpo guarda o que a mente não processou.

Ele fala através da insônia que não tem explicação.
Da tensão que nunca se desfaz.
Das dores crônicas que resistem a qualquer tratamento.

Ele pede escuta, pede espaço, pede nomeação.

Os sintomas são muitas vezes a única forma que o trauma encontra para ser reconhecido. Como uma criança que chora até que alguém a acolha.

E talvez, no fundo, seja isso: um pedido de acolhimento. Uma história que quer ser contada para que possa, enfim, descansar.

O Que Fazer Com o Que Herdamos?

Nem tudo o que nos atravessa precisa ser carregado.

O trauma pode ser herdado, mas a cura também.

A psicogenealogia nos ensina a olhar para trás sem ficar presos lá. A reconhecer os fios invisíveis que nos ligam ao passado, mas escolher o que queremos continuar tecendo.

Ao nomear o que antes era só sintoma, ao contar a história que ficou suspensa, algo se transforma. O peso nos ombros afrouxa. O peito encontra espaço para respirar.

E, aos poucos, o que parecia destino se revela possibilidade. O que parecia um ciclo se abre em caminho.

O passado não muda, mas o lugar que damos a ele, sim.

E quando escolhemos olhar, quando decidimos acolher, algo se desata.

E o corpo, enfim, descansa.

Herança Ancestral: Memórias e Transmissões Invisíveis

Foi por meio da Psicogenealogia que passei a examinar com mais profundidade a linhagem da minha avó Didi. Suas origens são permeadas por lacunas e narrativas fragmentadas, marcas de um passado que se impõe silenciosamente na história familiar.

Seu pai deixou o interior do Rio de Janeiro ainda criança para trabalhar na construção da ferrovia. As circunstâncias desse deslocamento permanecem obscuras: não se sabe ao certo se foi entregue, vendido ou se fugiu. O que é certo é que chegou a Minas Gerais e ali construiu sua trajetória como operário da Rede Ferroviária.

A mãe dela, minha bisavó, foi parteira e teve dois filhos. Faleceu jovem, antes de alcançar a idade que tenho hoje. Ao revisitar documentos familiares, descobri que carrego também o nome da avó dela: Margarida Carolina. Ela foi registrada assim, sem sobrenome, um dado que por si só revela muito sobre as dinâmicas de apagamento que atravessaram a história das mulheres da minha família. Meu pai, ao ver a certidão de nascimento, ficou surpreso – nunca havia notado essa coincidência. Mas as transmissões inconscientes são uma constante nos sistemas familiares, operando além da nossa percepção imediata.

O Espaço da Memória e as Narrativas da Infância

Nasci na casa da minha avó e, durante boa parte da infância e adolescência, transitei por aquele espaço como quem ocupa um território de afeto e pertencimento. No entanto, não tive a oportunidade de conhecê-la enquanto sujeito para além dos papéis sociais que lhe foram impostos.

Durante muito tempo, incomodava-me ouvir que eu me parecia com ela. Hoje, compreendo melhor a razão desse desconforto. Minha avó viveu em um tempo que limitava a expressão feminina, e ainda assim encontrou maneiras – muitas vezes subversivas – de dar forma ao que a atravessava. A perspectiva mudou: o que antes soava como um fardo, hoje reconheço como um traço de resistência, um legado que não se limita à carga genética, mas se manifesta em gestos, escolhas e impulsos que moldam minha própria trajetória.

Minhas recordações infantis são marcadas por noites em que, ao lado dos primos, ouvíamos suas histórias sobre o caboclo d’água. Ela não as contava como ficção – reivindicava sua descendência desse ser mítico. Mais tarde, compreendi que essas narrativas eram, na verdade, relatos codificados sobre nossos antepassados, fragmentos de uma cultura ancestral que resistiu à erosão do tempo.

Legados Invisíveis e os Caminhos do Desejo

Minha avó foi uma presença transgressora na minha infância. Era ela quem, às escondidas do meu pai, me concedia pequenos luxos: cachorro-quente, chocolate, voltas intermináveis no trenzinho da alegria. Esses momentos furtivos de cumplicidade desenhavam um outro tipo de transmissão, mais sutil, mas igualmente estruturante.

Embora não tenha lembranças precisas sobre quem me preparava para a escola, há uma cena gravada na memória: ela me levando ao seu quarto, passando batom e perfume em mim – e no meu cabelo –, enfatizando que era fundamental ir para a escola bonita e cheirosa. Minha avó não abria mão de certos símbolos de feminilidade: o batom vermelho e o esmalte impecável eram quase uma assinatura.

Engravidou cedo, casou apaixonada, teve filhos ainda muito jovem. Mas será que tinha desejos que transcendiam o casamento e a maternidade? Será que vislumbrava outros caminhos possíveis para si? Essas perguntas permanecem sem resposta.

Ela não me viu concluir os estudos, tampouco testemunhou minhas escolhas profissionais. Ainda assim, reconheço sua presença em aspectos que ultrapassam a linearidade do tempo. Dela, não herdei apenas o nome, a cor e as dores.

Herdei a capacidade de insurgência.
Herdei a força que resiste ao silenciamento.
Herdei a conexão visceral com a natureza e o ímpeto por liberdade.

E é nesse reconhecimento que me encontro.

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